Prof. Dr. William Puntschart
As olarias, antigas fábricas de louças de barro, tijolos, telhas e manilhas são consideradas, juntamente com a extração de pedras, precursoras do ciclo industrial de Mauá, principalmente a partir do final do século XIX e nas primeiras décadas do século XX.
Foram muitas olarias em atividade no município. De acordo com o Livro de impostos sobre profissões, importante manuscrito existente no Museu de Santo André, já em 1910 destacavam-se as olarias Viúva Grande e Filhos, no antigo Corumbé ( atual Zaíra ) e a de Bernardo Morelli, autor do primeiro plano de modernização econômica da cidade denominado Centro Industrial do Pilar.
No ano seguinte entra em funcionamento a olaria de Luiz Merloni, proprietário do casarão próximo à atual agência do Bradesco, que, mais tarde, abrigaria o Grupo Escolar Barão de Mauá, hoje Praça Teotônio Vilela. Já, na década de 1920, passam a fornecer tijolos e telhas as olarias de João Baptista Dell´Antonia e a dos Perrela, esta edificada próxima à antiga sede da prefeitura, na área do atual Shopping.
De acordo com o depoimento de oleiros e oleiras, o processo de produção de tijolos envolvia, basicamente, as seguintes etapas:
Recolhimento do barro, próprio para a fabricação, enviando-o para a pipa;
Na pipa, o muar, em movimentos circulares, amassava o barro com água;
O barro amassado, enviado para o batedor, era colocado na fôrma. Esta, muitas vezes, continha as iniciais dos nomes do dono da olaria;
Retirado da fôrma, o tijolo era colocado ao sol para secar;
Seco, o tijolo era emparedado no forno, disposto de tal maneira que possibilitava o recebimento de calor;
Depois de três dias e três noites ininterruptas sob o calor da queima da lenha, o produto era acondicionado nos caminhões para as devidas entregas.
Como se vê, o homem era o instrumento principal e a argila extraída do solo, a matéria-prima. Porém, o cotidiano nas olarias causou a esse grupo de trabalhadores inúmeros prejuízos à saúde. Hoje antigos oleiros sofrem de bronquite e reumatismo, entre outras enfermidades, causadas pelos trabalhos durante as madrugadas, fosse amassando o barro fosse alimentando os fornos de lenha. Também padecem com a terrível silicose, grave doença pulmonar cuja característica inicial é o fechamento das narinas, vedadas pela poeira, devido ao contato direto com o pó da terra. A própria aposentadoria é difícil de ser obtida, pois faltam documentos e provas dos anos de trabalho.
De qualquer maneira, o fato é que graças aos esforços desses trabalhadores, ocorreu o desenvolvimento de bairros inteiros e da própria cidade, principalmente a partir da segunda metade do século XX, quando Mauá presencia verdadeira explosão demográfica. No Zaíra, por exemplo, Chafik Mansur Sadek, responsável pelo loteamento do bairro, também produzia tijolos e telhas, oferecidos gratuitamente aos compradores dos lotes.
Nessa época, foi publicado o Anuário de 1956 de Paulo Zingg, no qual estão discriminadas as seguintes olarias em atividade em Mauá, no final da década de 50:
Olarias Local
Alexandre Esposti Estrada da Adutora Rio Claro
Américo Segundo Bagnhara Estrada da Pedreira s. n
Angelo Cordeiro Sítio João Domingos dos Passos
Antonio Damos Vila Assis Brasil
Domingos Braga Sítio João Domingos dos Passos
Francisco Hernandes Bairro Taquarussú (Lisboa)
Irmãos Peixoto Sítio João Domingos dos Passos
João Batista Bento Sítio dos Branco
José Bela Bairro do São João
Kliot Mendes Gonçalves Sítio da Bocaina
Lindolfo de Carvalho Sertãozinho
Oliveira Sítio do Feital
Osvaldo Augusto Estrada da Pedreira
Santo Zanatelli Sítio da Bocaina
Sistílio Benevento Lotto Estrada do Corumbé, atual Zaíra
Soares e Filhos Sítio do Feital
Apesar da importância intrínseca, esse documento não aponta todas as olarias em atividade naquele época. No Feital, por exemplo, onde entrevistamos antigos oleiros, além da Oliveira e Soares e Filhos, operava a Bom Filho. Por sinal, quase toda a produção dessas olarias foi enviada para a compor a modernidade de Brasília, Capital Federal.
Localizadas geralmente em áreas rurais na época, muitas dessas olarias funcionavam de forma rudimentar. Além de não ser possível a sua industrialização mecânica, a produção ainda estava sujeita às variações climáticas, porém a realização do trabalho, predominantemente familiar, proporcionou à cidade certa urbanização com desenvolvimento econômico.
Por fim, é importante ressaltar que através das memórias desses trabalhadores, além das dificuldades cotidianas, surgem sons e imagens de um passado quase esquecido. Assim, durante as madrugadas ouvia-se o amassar do barro e no início das manhãs, em harmonia com os cantos dos pássaros, o bater das fôrmas de tijolos.
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