Conto: O Homem que Andava com o Diabo
Dizia-se que, na juventude, Aristeu tinha trabalhado na olaria do Zaira, onde sofreu um acidente e ficou dias entre a vida e a morte. Quando voltou, voltou diferente. Nunca mais faltou dinheiro, nem comida. O caseiro da antiga Cerâmica Miranda dizia que viu Aristeu falando sozinho no mato à meia-noite, numa noite sem lua.

Em meados da década de 1940, quando a Vila Vitória ainda era um bairro de terra vermelha e ruas sem iluminação, havia um homem que ninguém ousava encarar por muito tempo. Aristeu Batista, morador de uma pequena casa de tábua próxima ao cemitério antigo, vivia sozinho, falava pouco, mas era conhecido por algo que não se explicava.
Diziam que ele nunca andava — aparecia.
Na feira da Bocaina, um freguês dizia tê-lo visto escolhendo batatas às 7h30. Às 7h45, outro jurava que o viu sentado na mureta da linha férrea da estação Mauá, quase dois quilômetros dali. Às 8h, um grupo de fiéis da Igreja da Matriz disse que o viu parado, imóvel, olhando as obras da capela.
“Fez pacto, só pode”, dizia a costureira Dona Nena, que morava ao lado da escola da Vila Magini.
As histórias aumentavam
As crianças tinham medo de passar pela viela atrás do cemitério ao cair da tarde, onde — segundo a lenda — Aristeu sumia entre os túmulos e aparecia do outro lado da linha, como se tivesse sido levado por algo ou alguém que o carregasse pelo vento.
Seu Tonico, antigo ferroviário da São Paulo Railway, contou certa vez que o viu dentro do trem da linha Santos-Jundiai vindo de Santo André de terno preto, e quando desceu em Mauá, Aristeu já estava lá na plataforma. “Desceu antes do trem parar”, dizia Tonico, com os olhos arregalados.
O pacto
Dizia-se que, na juventude, Aristeu tinha trabalhado na olaria do Zaira, onde sofreu um acidente e ficou dias entre a vida e a morte. Quando voltou, voltou diferente. Nunca mais faltou dinheiro, nem comida. O caseiro da antiga Cerâmica Miranda dizia que viu Aristeu falando sozinho no mato à meia-noite, numa noite sem lua.
“Ele não reza, não vai à missa, e os cachorros fogem quando ele passa”, diziam os vizinhos. Uns achavam que ele dominava “coisas de alma”, outros diziam que era só um velho esquisito. Mas ninguém queria descobrir.
O dia do sumiço
Numa manhã de agosto, Aristeu foi visto andando lentamente em direção ao cemitério com uma marmita de alumínio na mão. Uma hora depois, ninguém o viu mais. Nem em Pilar, nem na Bocaina, nem nos trilhos, nem no Zaira. Os trilhos estavam vazios, e o portão do cemitério, entreaberto.
Na casa dele, a porta estava destrancada. Em cima da mesa, havia apenas um bilhete rabiscado:
“Quem sabe andar com o Diabo, não precisa pedir carona a ninguém.”
Qual é a sua reação?






