Cerqueira Leite: a fábrica que moldou o futuro de Mauá

A Cerâmica Cerqueira Leite marcou o crescimento de Mauá com sua produção de tijolos e telhas que ergueram casas e histórias. Seu forno, sempre aceso, simbolizava o trabalho árduo de quem acreditava no progresso da cidade. Hoje, resta a lembrança da fumaça que se misturava ao céu, guardando o eco de uma Mauá que se construía tijolo a tijolo.

Cerqueira Leite: a fábrica que moldou o futuro de Mauá

Nos tempos em que Mauá ainda se firmava como terra de sonhos e trabalho, um português chamado Antônio Garcia Villela desembarcava no Brasil em busca de novas oportunidades. Era o ano de 1923. Apenas dois anos depois, ele ergueria, na continuação da rua Santa Helena, uma fábrica que marcaria o início de uma era: a Fábrica Nacional de Artefatos de Porcelana Brasilusa — dedicada à produção de isoladores, tijolos refratários e artigos em terracota.

Villela era um homem de garra e talento. A seu lado, trabalhadores como Reinaldo Chiarotti e Emilio Pasionati ajudaram a transformar argila em sustento, e sustento em progresso. Reinaldo, que começou a trabalhar aos 13 anos na Fábrica Grande, logo se tornaria um dos pilares da nova empresa.

Em 1937, a fábrica passou para novas mãos. O empresário José Cândido de Cerqueira Leite adquiriu o negócio por 240 contos de réis e deu a ele o nome que ficaria para sempre gravado na história da cidade: Cerâmica Cerqueira Leite. Sob sua direção, a produção foi modernizada, voltando-se para isoladores de baixa tensão — um produto essencial para o avanço da eletrificação no Brasil.

Villela, já idoso, ainda permaneceu algum tempo como gerente. Diziam que, apesar da idade, “era uma fera” — enérgico, exigente e apaixonado pelo ofício.

A nova fase trouxe expansão e prosperidade. A Cerqueira Leite chegou a empregar 300 trabalhadores em 1952 e se destacou não apenas pela produção, mas também pelo cuidado com sua gente. A fábrica mantinha escola primária para os filhos dos empregados, oferecia cursos técnicos profissionalizantes e contava com um departamento médico completo, onde atuavam o doutor Radamés Nardini e o enfermeiro Domingos Ortega.

Enquanto a lama branca era retirada nos fundos do bairro Itapeva — trabalho feito por um italiano chamado Pucci, que extraía argila com sua vanga sob o sol —, dentro da fábrica o som dos fornos e o ritmo dos moldes davam vida ao que viria a ser uma das maiores indústrias cerâmicas do país.

Mas como toda história de grandeza, também haveria um fim. A partir de 1968, com a saída de parte da equipe técnica e administrativa, começaram os primeiros sinais de declínio. Mesmo com muitos pedidos em carteira, as portas da Cerqueira Leite se fecharam em 1º de abril de 1970.

Ainda assim, o legado era imenso. A Prefeitura de Mauá desapropriou os pavilhões da antiga fábrica, que passaram a abrigar exposições e eventos industriais, preservando, de certa forma, o espírito criativo que nasceu ali.

Antes do encerramento, a Cerqueira Leite viveu tempos de esplendor. O próprio José Cândido construiu, em 1943, uma mansão na Vila Guarani — hoje local da Igreja dos Mórmons — com 800 metros quadrados, rodeada por árvores e adornada por um imenso painel pintado por Fulvio Benachio, retratando uma festa de São João nordestina.

E se Mauá tinha coração operário, também tinha alma esportiva: foi nas terras da Cerqueira Leite que nasceu o EC Cerqueira, um time de futebol formado pelos próprios funcionários, herdeiros do antigo campo da AA Industrial.

Mais do que uma fábrica, a Cerqueira Leite foi um símbolo de uma época. Um espaço onde o barro se transformava em porcelana e o trabalho em dignidade — moldando não apenas isoladores, mas histórias, famílias e gerações inteiras de mauaenses.

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