Entre Estetoscópios e Esperança: A Evolução da Medicina em Mauá
Nas décadas de 1930 e 1940, Mauá dava seus primeiros passos rumo à modernidade. A população, que em 1934 era de pouco mais de 1.800 habitantes, cresceu vertiginosamente, ultrapassando os 100 mil moradores quarenta anos depois. Com o desenvolvimento econômico impulsionado pelas cerâmicas, pedreiras e curtumes, surgiram também novas demandas — entre elas, o atendimento à saúde pública, até então praticamente inexistente.
A trajetória da saúde em Mauá se confunde com a própria história de crescimento da cidade. Muito antes de conquistar sua emancipação política de Santo André, em 1953, o então distrito de Pilar já vivia um momento de transição: de pequeno vilarejo industrial para um centro urbano em plena expansão.
Nas décadas de 1930 e 1940, Mauá dava seus primeiros passos rumo à modernidade. A população, que em 1934 era de pouco mais de 1.800 habitantes, cresceu vertiginosamente, ultrapassando os 100 mil moradores quarenta anos depois. Com o desenvolvimento econômico impulsionado pelas cerâmicas, pedreiras e curtumes, surgiram também novas demandas — entre elas, o atendimento à saúde pública, até então praticamente inexistente.
Os primeiros médicos e a luta pelo atendimento local
Antes de se tornar município, Mauá não possuía hospitais nem postos de saúde. Os moradores dependiam quase exclusivamente dos serviços oferecidos em Santo André, o que tornava qualquer tratamento mais demorado e difícil. Nesse cenário, surgem três nomes fundamentais, que ajudaram a escrever as primeiras páginas da medicina mauaense: Dr. Jalles Martins Salgueiro, Dr. Joaquim Alves dos Reis e Dr. Radamés Nardini.
Esses pioneiros foram muito mais do que médicos. Foram líderes comunitários, construtores de instituições e símbolos de dedicação ao próximo — responsáveis por transformar o que antes era improviso em estrutura.
Dr. Jalles Martins Salgueiro — o primeiro consultório e o início de tudo
O Dr. Salgueiro foi o primeiro médico a clinicar em Mauá, inaugurando seu consultório em 1942, quando o local ainda era um distrito de Santo André. Formado pela Universidade Federal do Paraná, ele se mudou com a família para a cidade e logo passou a atender operários das indústrias e moradores das redondezas.
Sua atuação ultrapassou a medicina. Militar de carreira e entusiasta do movimento autonomista, participou ativamente da luta pela emancipação política da cidade. Foi também um dos articuladores da primeira unidade de saúde pública de Mauá, criada entre 1948 e 1949, plantando as sementes de um sistema que nasceria oficialmente anos mais tarde.
Dr. Joaquim Alves dos Reis — o primeiro médico municipal
Com a emancipação, em 1954, Mauá passou a estruturar sua administração pública, e com ela, o primeiro serviço médico municipal. À frente desse trabalho estava Dr. Joaquim Alves dos Reis, o primeiro médico contratado pela Prefeitura, atuando como Diretor do Serviço Médico no governo do primeiro prefeito, Ennio Brancalion.
Os desafios eram imensos. Conforme registra o historiador Ademir Médici em De Pilar a Mauá, o início foi modesto:
“O Serviço Médico Municipal começou pobre, com uma mesa, um tinteiro e quase nada mais. O primeiro material médico foi comprado porque um clube de futebol da cidade vendeu suas camisas e doou o dinheiro ao setor.”
Dr. Joaquim tornou-se, assim, o primeiro secretário de saúde de Mauá, símbolo de um tempo em que a solidariedade e o esforço coletivo supriam a falta de estrutura.
Dr. Radamés Nardini — o homem que construiu hospitais
Entre os nomes mais lembrados da história mauaense, está o do Dr. Radamés Nardini, que chegou à cidade em 1944, pouco depois de se formar em medicina. Atendeu moradores e funcionários das empresas Porcelana Real, Cerâmica Mauá e Cerâmica Cerqueira Leite, ganhando o respeito e o carinho da população.
Mas Nardini foi além do consultório. Visionário, ele se tornou o grande construtor de hospitais em Mauá. Fundou em 1956 o Hospital e Maternidade Mauá, atual Hospital Vital, na Vila Assis Brasil — o primeiro hospital da cidade.
Duas décadas depois, contribuiu decisivamente para a construção do Hospital Municipal Dr. Radamés Nardini, inaugurado em 1986 e batizado em sua homenagem. Mesmo sem residir em Mauá, manteve fortes vínculos com a cidade, deixando um legado de dedicação, ética e compromisso com a saúde pública.
A Santa Casa de Mauá e a fé que curava
A história da saúde mauaense também passa pela fé e pela solidariedade. Em 1963, nasceu a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Mauá, formada por políticos e empresários locais. Três anos depois, em 12 de junho de 1966, foi inaugurado o Hospital Imaculada Conceição, a tradicional Santa Casa de Mauá, o segundo hospital mais antigo da cidade.
O prédio, localizado na Vila Bocaina, abrigava a Capela Cristo-Rei, adornada com obras sacras do artista romeno Emeric Marcier, pintadas entre 1942 e 1947 — hoje tombadas como patrimônio histórico do município.
Na década de 1970, surgiria ainda o Hospital América, idealizado por médicos e empresários da região, inaugurado oficialmente em 1998, com moderna estrutura e atendimento particular.
A rede de saúde atual
Hoje, Mauá conta com uma rede pública consolidada, composta por 23 Unidades de Saúde, 4 UPAs, o Hospital Municipal Dr. Radamés Nardini, o Ambulatório Médico de Especialidades (AME) e uma série de clínicas e hospitais privados.
Após sua inauguração sob gestão estadual, o Hospital Nardini foi municipalizado na década de 1990 e, desde 2010, está sob administração da Fundação do ABC (FUABC), que também coordena boa parte do sistema público de saúde local.
Um legado de cuidado e humanidade
A história da saúde em Mauá é, acima de tudo, uma história de coragem, solidariedade e transformação. O que começou com consultórios simples e recursos limitados evoluiu para uma rede estruturada que atende quase meio milhão de moradores.
Nomes como Salgueiro, Joaquim e Nardini representam uma geração de médicos que enxergava na medicina uma missão de vida — e em Mauá, um lar para construir um futuro melhor.
Mais do que curar doenças, esses pioneiros ajudaram a construir uma cidade mais humana, onde a saúde é vista como um direito e a memória é tratada com o mesmo cuidado que um paciente em busca de esperança.
Referências bibliográficas:
MÉDICI, Ademir. De Pilar a Mauá. Prefeitura do Município de Mauá, 1986.
PUNTSCHART, William. Memórias da Cidade. Assahi Gráfica e Editora, 2004.
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