Conto: Uma Noite na Coke Luxe
Na efervescente Mauá dos anos 1990, a casa noturna Coke Luxe, localizada na Rua Princesa Isabel, era o ponto de encontro da juventude alternativa. Com duas pistas de dança — a principal, voltada ao dance pop e hits da época, e a misteriosa pista secundária conhecida como "Inferninho", dedicada ao rock gótico e new wave — o local era palco de encontros intensos e momentos inesquecíveis.

Era sábado à noite e Mauá vibrava em sua própria frequência. Em frente ao número 210 da Rua Princesa Isabel, um grupo de jovens ria alto, com calças largas, cabelos coloridos, piercings brilhando à luz dos postes e olhos cheios de expectativa. A entrada da Coke Luxe, com sua fachada de neon vermelho, era como um portal: ao cruzá-lo, o mundo lá fora desaparecia.
A casa noturna era lendária — duas pistas, duas almas. Na pista principal, luzes estroboscópicas dançavam junto com os corpos suados embalados por La Bouche, Technotronic, Corona, Haddaway, e batidas eletrônicas que pareciam fazer o coração bater no mesmo BPM da música. Lá em cima, no camarote, garotas com botas plataforma e meninos de regata cavada tiravam fotos com câmeras descartáveis e gritavam o refrão de What Is Love como se fosse um hino de guerra.
Mas o coração sombrio da noite estava lá embaixo. Era conhecido como o Inferninho — um corredor escuro, úmido, iluminado apenas por luzes vermelhas e uma máquina de fumaça que nunca parava. O cheiro era de cerveja, cigarro e desejo não declarado. Lá, os cabelos eram tingidos de preto, os olhos carregavam delineadores espessos, e as almas pareciam pairar entre os acordes distorcidos de Sisters of Mercy, The Cure, Joy Division e Siouxsie and the Banshees.
Foi ali que André, 19 anos, viu Melissa pela primeira vez. Ela usava um vestido de renda preta, batom vinho e botas de vinil. Não dançava, apenas deslizava pelos cantos, como se tivesse sido esculpida em névoa. Quando seus olhos se cruzaram, Lucretia My Reflection explodiu nas caixas de som como um feitiço. Ele se aproximou. Ela sorriu — ou pelo menos ele achou que sim.
“Você é mais dance ou mais inferninho?”, ela perguntou, com um sotaque que misturava ironia e tédio.
“Depende da companhia”, ele respondeu, tentando parecer mais misterioso do que realmente era.
E ali ficaram. Dançaram sem se tocar, riram sem razão, beberam o que parecia um drink com gosto de infância corrompida e, entre uma música e outra, se perderam — não um no outro, mas em si mesmos. Como todo mundo naquela noite.
Lá fora, a madrugada avançava e os primeiros sinais do domingo ameaçavam apagar a magia. Mas dentro da Coke Luxe, o tempo não existia. Era sempre sábado. Sempre noite. Sempre juventude.
Na saída, com o corpo suado e os ouvidos zumbindo, André se perguntou se veria Melissa de novo. Talvez sim, talvez não. Na Coke Luxe, as conexões eram intensas e efêmeras, como faíscas numa pista de dança.
O que importava é que ele viveu.
E em Mauá, nos anos 90, isso era tudo.
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